domingo, 16 de março de 2008

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

este blogue morreu hoje... eram 13 e 36


"13h, 36m, -35 degrees" de thomas ruff

quando

me exigem o universo
e não se é deus
olho o céu
com o dedo
na estrela da meia-noite
entre os dois moinhos
no luar do monte

é tua
dou-ta
porque amor é seu nome

e
com ela
este blogue
morreu hoje


Daniel Sant'Iago

sexta-feira, 1 de fevereiro de 2008

texto cru porque nus



"untitled" de Nadja Bernhardt

Texto nu e cru este sem leitura outra.

Texto nu e cru que nunca pensei escrever.

Sem entrelinhas nem figuras de estilo nem outra resolução.

Para adultos sem reservas que não usam bolinhas vermelhas.

Palavras de sentido único directas ao alvo sem rodeios.

Foder > de "futere"(lat) = ter relações com mulher.

Há palavras malditas porque mal ditas.
Foder é uma delas e é palavra de amor.



O

Envolve-me docemente.

Que os teus braços sejam abraço envolvente.
Sem pressas com vagar devagar de-va-ga-ri-nho.

Isso. Assim.


Mão na nuca com dedos vincados que esmaguem meus lábios
bem abertos contra os teus em oferta.
Que as línguas se toquem, se entrelacem e deslacem nossos corpos.


Isso. Assim.


Encosta-te, enrosca-te e sente o que endurece, em mim e em ti,
sob botões arrancados à força, num repente alucinado.
Os lábios beijam.
Os dentes mordem.


Isso. Assim.


E, chegados aos ouvidos,
aflorados os lóbulos pelos recantos mais recônditos,
que os lábios sussurrem,
murmurem,
repitam
e gritem,
sem receios nem temores nem medos nem terrores
de que as paredes oiçam e os vizinhos estremeçam,


Isso... Assim...

Em uníssono...


- Fode-me!

Isso.
Assim.

Nus e crus.
O texto.
Eu_e_tu.

Daniel Sant'Iago

terça-feira, 29 de janeiro de 2008

da mágoa


"old man in sorrow" de van gogh

magia de um sedutor

das minhas palavras
ao teu semblante


desgosto de vida
em recolhimento

traços de água
transparente


água de um mago

a mágoa

Daniel Sant'Iago

quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

são lágrimas, senhora, são lágrimas


"lágrimas" de paco labiano

Tantas lágrimas...
Porque choras?
Que mal te fiz?

Diz!

Que foi que aconteceu?
Que te deu?


Tens dores?
Onde te dói?
Sofres?


Não me digas que não foi nada...

Que pranto!
Morreu alguém?


espera um pouco

Não me digas que são lágrimas de crocodilo...
Pareces uma manhã de orvalho...
Um rio de gotas essas lágrimas a fio...

espera mais um pouco
sufoquei

Brincou nervosa com a lágrima que trazia ao pescoço.
Um pingente!
Sinal presente de um-dia-de-não-sei-quê.


não te assustes
cheirei o frasco do amoníaco
falta de siso
só isso

Desdobrou-se em gargalhadas.
Chorou de riso.
Mais lágrimas.
Outras mais.

acreditaste
em lágrimas
de amoníaco

cegaste há muito
parva

Daniel Sant'Iago

segunda-feira, 21 de janeiro de 2008

comover ou como ver ou com o ver


"night moves" de migdalia arellano

comover-te

como ver-te
com o ver-te

como se comover-te
fosse

ver-te com o olhar
comer-te com os olhos

afinal
comover-te foi
pôr-me-e-te em movimento
abalar-te-e-me
e
no momento de abalar
não comer
para não te voltar a ver

Daniel Sant'Iago

quarta-feira, 16 de janeiro de 2008

sabores de beijos


"flavor" de niro vasali

no bar frente ao mar

uma bica pequena cremosa morena sem açúcar
amarga
um quadrado de chocolate quase cacau
amargo

Prova! Sorve! Saboreia!

Que tal?
O amargo é delicioso!

beijei teus lábios
amargos


na estrada para o cabo
uma azeda na berma do caminho
caule verde fino sob pétalas amarelas

azedo

duas camarinhas pérolas leitosas do mato

azedas


Prova! Sorve! Saboreia!

Que tal?
O azedo é delicioso!

beijei teus lábios
azedos


na serra nua junto ao convento
este caule mais grosso de seiva láctea
acre
doce


Prova! Sorve! Saboreia!

Que tal?
O agridoce é delicioso!

beijei teus lábios
amaros
doces


em casa
do frio em gelo

numa bolacha em cone duas bolas de sorvete de baunilha

um fio de chocolate quente derretido
um semi-frio
todo doce


Prova! Sorve! Saboreia!

Que tal?
Não é semi-frio!

É muito doce e semi-quente!

beijei teus lábios
muito

Daniel Sant'Iago

sábado, 12 de janeiro de 2008

digníssimo e meretíssimo senhor doutor juiz


"civil justice" de diana ong

Não me julgues!

Nunca!

Não me julgues pelo meu comportamento!

Não me julgues porque te dizes meu amigo!

(Como se ser-meu-amigo te desse o direito
de
me julgares e de seres justo ou injusto!)

Mesmo amigo, não conheces o meu pensamento!
A não ser que eu to diga e consiga confessar tudo!
(
É que nem eu tenho consciência de todas as reais
circunstâncias
que condicionam o meu comportamento!)

O meu comportamento não é o meu pensamento!
Estão correlacionados mas tem características diferentes.

O pensamento é o pensamento!
O comportamento é o comportamento!


(Nem me venhas com essa de que não me julgas.
Que o que julgas são os meus comportamentos.

Como se estes existissem sem mim!)

O meu comportamento não sou eu!
Nem, tão pouco, o meu pensamento!


Já to disse e repito!

Não me julgues!
Nem porque te pareço um santo.

Nem porque te pareço uma merda.


Os santos também perdem os amigos!

E a merda não é flor que se cheire!

Daniel Sant'Iago

quarta-feira, 9 de janeiro de 2008

a preto e branco


"curiosity" de jon bertelli

chorar por amor
não será amar
mas sofrer

amar seria rir
ou
pelo menos
sorrir

quando amo a preto e branco
como pinto os cinzentos?

Daniel Sant'Iago

sexta-feira, 4 de janeiro de 2008

o (teu) vulcão


"the visit of venus to vulcan"
françois boucher


(
texto um)
escalada penosa a da encosta
dum vulcão
julgado acessível
no entanto
gretei os lábios
feri as mãos
e
à beira da cratera
na atracção da chama
queimei os dedos na lava rubra
do vulcão
julgado adormecido

(
texto dois)
escalada penosa a da encosta
dum vulcão

julgado acessível

no entanto

gretei os lábios

feri as mãos

e
à beira da cratera
na atracção da chama
queimei os dedos na lava rubra
do
TEU vulcão
julgado adormecido


Daniel Sant'Iago

segunda-feira, 31 de dezembro de 2007

colirium para 2008


*
de olhos vermelhos
lágrimas tintas
morto de sal
o mar

de olhos verdes
lágrimas azuis
atol das maldivas
amar

duas gotas em cada olhar
medicamento genérico

Daniel Sant'Iago

*
"eye of the beholder" de dale kennington

segunda-feira, 24 de dezembro de 2007

a todos... a minha prenda de natal


"le grand sapin" de paul cézanne

Para ti.
Eu conto.

O MEU PINHEIRO-MANSO

Domingo.
De Março.
Meio do dia.

Chega da missa com as costas da mão direita
alapada aos rins.

E um saco de plástico amarrotado, seguro pelas asas.
Bate as botas no tapete da entrada.
Salta-lhe o pó e um grito:

- Malditas cruzes!

(que cruzes, avô, que cruzes?)
- Aqui… não nas vês?

Não.

Mas hoje sei.
Porque as sinto embora ainda as não veja.
Cruzes, canhoto!

Após o almoço de sopa, pega pelas asas o tal saco.
De plástico.
Ainda e todo amarrotado.

A sachola c(r)avada no ombro.

E sai:

- Já te chamo.

Mais pela tardinha, a senha ressoa pela encosta,
vinda da várzea, junto ao ribeiro:

- Já não falta cá ninguém!
- Lá vou, meu avô, lá vou! – a contra-senha pelo
caminho inverso.

O carreiro da fazenda ziguezagueia sob os meus pés.

- Pega!

Passa-me das suas mãos de calos para a ternura
das minhas o cabo nodoso da sachola.

- Cava aqui um buraco do tamanho dum palmo dos meus.

E aponta com a bota.
Olho.
Meço.
Cinco vezes o meu palminho.
Umas sacholadas na terra negra de estrume.

- Chega. Abre este saco de plástico.
- Um pinheiro, avô!

Reconheço a planta na palma da minha mão.

- Comprei-o ao Ti Adelino, hoje, ao sair da missa.

Planta-o.

Encosto a sachola às cepas de quatro videiras
acabadas de arrancar. Frescas. Húmidas.
Bem no centro, aconchego de terra o pinheiro
como quem puxa o cobertor de papa sobre o corpo
dum filho.

Para que não tenha frio.
E durma sereno.

- Este é o teu pinheiro-manso.
Não o cures.
Cuida dele como aos teus.
Até aos netos dos teus netos.

E, desde então, o meu pinheiro-manso cresceu comigo.
Segurei-o a uma estaca.

Podei-o.
Resguardei-o da ventania.
Reguei-o.
Vi da flor a pinha.
Trinquei da pinha o pinhão.
Assado pelo forno do Sol.

(vai, daniel! aguento-me já de pé.
não me cures. cuida-me!)

Entre ramos, construí cabana de paus e baraços.

Entrelaçados entre nós lassos.
E fumei o primeiro cigarro proibido.

E li o primeiro livro proibido.
E o primeiro amor proibido.
E a primeira vez clandestina.

sobre cama de carumas

catei pinhões e fiz o pino
gritei palavrões e cantei hinos

O meu pinheiro-manso será o mais velho.

De outros pinheiros-mansos.
Os dos meus filhos e os dos meus netos.

naquela várzea de vinha velha
junto ao ribeiro
na fazenda do meu avô
lá bem ao fundo
duma árvore nasceu um bosque

Ao meio do dia.

De um março.
Era Domingo.
Foi Natal.

.................................................

Nos natais, renasço!
Nas passagens de ano, acorrento-me à Esperança!
Deixo-vos, feito menino jesus de minha mãe,
a cada um e a cada uma de vós,
um punhado de pinhões torrados
em forno de sol.

Das pinhas do meu pinheiro-manso!

Daniel Sant'Iago

domingo, 23 de dezembro de 2007

o meu pinheiro manso - III


"le grand sapin" de paul cézanne

(
... Abre este saco de plástico.)

- Um pinheiro, avô!


Reconheço a planta na palma da minha mão.

- Comprei ao Ti Adelino, hoje, ao sair da missa.

Planta-o.

Encosto a sachola às cepas de quatro videiras
acabadas de arrancar. Frescas. Húmidas.
Bem no centro, aconchego de terra o pinheiro
como quem puxa o cobertor de papa sobre o corpo
dum filho.

Para que não tenha frio.
E durma sereno.

- Este é o teu pinheiro-manso.
Não o cures.
Cuida dele como aos teus.
Até aos netos dos teus netos.

E, desde então, o meu pinheiro-manso cresceu comigo.
Segurei-o a uma estaca.

Podei-o.
Resguardei-o da ventania.
Reguei-o.
Vi da flor a pinha.
Trinquei da pinha o pinhão.
Assado pelo forno do Sol.

(vai, daniel! aguento-me já de pé.
não me cures. cuida-me!)

Entre ramos, construí cabana de paus e baraços.

Entrelaçados entre nós lassos.
E fumei o primeiro cigarro proibido.

E li o primeiro livro proibido.
E o primeiro amor proibido.
E a primeira vez clandestina.

sobre cama de carumas

catei pinhões e fiz o pino
gritei palavrões e cantei hinos

O meu pinheiro-manso será o mais velho.

De outros pinheiros-mansos.
Os dos meus filhos e os dos meus netos.

naquela várzea de vinha velha
junto ao ribeiro
na fazenda do meu avô
lá bem ao fundo
duma árvore nasceu um bosque

Meio do dia.

De Março.
Domingo.

Daniel Sant'Iago

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

o meu pinheiro manso - II


"roads IV" de stacy dynan

(- Já te chamo.)

Mais pela tardinha, a senha ressoa pela encosta,
vinda da várzea, junto ao ribeiro:

- Já não falta cá ninguém!
- Lá vou, meu avô, lá vou! – a contra-senha pelo
caminho inverso.

O carreiro da fazenda ziguezagueia sob os meus pés.

- Pega!

Passa-me das suas mãos de calos para a ternura
das minhas o cabo nodoso da sachola.

- Cava aqui um buraco do tamanho dum palmo dos meus.

E aponta com a bota.
Olho.
Meço.
Cinco vezes o meu palminho.
Umas sacholadas na terra negra de estrume.

- Chega. Abre este saco de plástico.

Daniel Sant'Iago